Imóvel executado pode ser arrematado por preço vil? Entenda

arremate de imóvel a preço vil

Pode arrematar imóvel por preço vil em um leilão extrajudicial?

Essa é uma dúvida recorrente entre credores, devedores e interessados em leilões de bens imóveis. Embora os leilões extrajudiciais sejam uma ferramenta eficaz para a recuperação de crédito, há limites legais que visam garantir justiça e equilíbrio no processo. 

Um dos principais é a proibição da arrematação por preço vil, tema que tem ganhado destaque nas decisões dos tribunais superiores e nas recentes alterações legislativas.

A discussão sobre a validade de arremates realizados por valores muito abaixo do mercado tornou-se ainda mais relevante após o posicionamento do Superior Tribunal de Justiça (STJ) e a promulgação da Lei nº 14.711/2023

Essa legislação firmou o entendimento de que não se pode arrematar imóvel por preço vil, ainda que o procedimento ocorra fora do Poder Judiciário. 

A regra é clara: a proteção ao devedor e a preservação do valor justo do bem devem prevalecer, mesmo nos casos de inadimplência.

Dessa forma, compreender os limites legais da execução extrajudicial e os riscos de se tentar arrematar imóvel por preço vil é importante para evitar nulidades, perdas financeiras e litígios judiciais.

Ao longo deste artigo, você vai entender o que é considerado preço vil, como o STJ tem decidido sobre o tema e por que é fundamental respeitar os princípios da legalidade, proporcionalidade e função social da propriedade.

 O que é arrematação de imóvel em execução extrajudicial?

A arrematação de imóvel ocorre quando o bem do devedor é levado a leilão para satisfazer uma dívida que não foi paga no prazo estipulado. 

Na esfera da execução extrajudicial, essa alienação forçada se dá sem a necessidade de ação judicial, especialmente nos casos em que o contrato é garantido por alienação fiduciária em garantia, como previsto na Lei nº 9.514/1997.

Esse tipo de execução permite que, diante da inadimplência, o credor promova o leilão do imóvel diretamente, respeitando os trâmites legais estabelecidos.

Ainda que o procedimento não envolva diretamente o Judiciário, ele deve seguir regras rigorosas para garantir a proteção dos direitos do devedor. 

O processo exige notificação formal do inadimplemento, observância dos prazos legais e a realização de dois leilões — o primeiro, com lance mínimo equivalente ao valor da dívida garantida pela alienação fiduciária, e o segundo, com possibilidade de aceitar valor inferior, desde que não se configure preço vil

Afinal, o que caracteriza o preço vil na arrematação de imóvel?

O conceito de preço vil não está claramente definido em uma única norma legal, mas seu entendimento foi sendo construído com base na jurisprudência e na doutrina. 

Objetivamente, considera-se vil o preço que representa menos de 50% do valor de avaliação do imóvel, conforme estabelece o artigo 891, parágrafo único, do Código de Processo Civil (CPC)

Essa referência também tem sido adotada por analogia em execuções extrajudiciais, especialmente ao questionar a validade da arrematação perante o Poder Judiciário. 

Além da proporção matemática, o conceito de preço vil também pode envolver uma análise qualitativa, considerando o contexto da venda, o grau de desvalorização e os indícios de abuso. 

O objetivo dessa proteção é impedir que o devedor perca seu patrimônio por valor irrisório e que o bem seja transferido por quantia desproporcional ao seu valor real de mercado. 

Tal prática comprometeria os princípios fundamentais do direito brasileiro, como a função social da propriedade, a boa-fé objetiva e a dignidade do devedor.

A jurisprudência do STJ e a vedação ao preço vil

A jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça (STJ) é clara ao afirmar que o arremate de imóvel por preço vil é vedado, inclusive no âmbito das execuções extrajudiciais, como aquelas regidas pela Lei nº 9.514/1997, que trata da alienação fiduciária de bens imóveis. 

O entendimento do STJ parte da seguinte premissa: mesmo que a lei mencionada não trouxesse, inicialmente, uma vedação expressa à venda por preço vil, isso não impede sua interpretação. As normas gerais do Código de Processo Civil (CPC) devem ser aplicadas de forma subsidiária. O objetivo é garantir a proteção do devedor e também assegurar o respeito aos princípios da razoabilidade e da dignidade da pessoa humana.  

Em outras palavras, o STJ tem reconhecido que a execução extrajudicial não pode ser utilizada como um atalho para se desfazer de bens por valores desproporcionais. 

O devedor, mesmo inadimplente, não perde sua proteção jurídica. Assim, arrematar um imóvel por valor irrisório — muito abaixo do preço de mercado — é prática ilegal, porque viola o direito à propriedade e o devido processo legal. 

O Tribunal tem aplicado, por analogia, o art. 891, parágrafo único, do CPC, que veda a alienação judicial por preço vil, justamente para preservar a legitimidade do processo de execução, mesmo quando realizado fora do Judiciário.

Um exemplo ilustrativo dessa posição foi o julgamento realizado pela Terceira Turma do STJ, no qual o imóvel foi arrematado por somente 39% do valor de avaliação oficial

Diante dessa desproporção evidente, o Tribunal declarou a nulidade da arrematação, entendendo que o negócio feriu os princípios da proporcionalidade, da legalidade e da justiça

O STJ reforçou, nesse julgamento, que nem mesmo a natureza extrajudicial da execução afasta a necessidade de observância dos direitos fundamentais, como a função social da propriedade e a proibição do enriquecimento ilícito.

Por que não se pode arrematar imóvel por preço vil?

A prática de arrematar imóvel por preço vil não só compromete a justiça e o equilíbrio do processo de execução, mas também desafia princípios fundamentais do direito, como a dignidade da pessoa humana, a função social da propriedade e a boa-fé objetiva

Quando um imóvel é arrematado por um valor extremamente inferior ao seu valor de mercado, o resultado do leilão se torna questionável, porque pode ferir o direito do devedor à preservação do seu patrimônio. 

Embora a inadimplência do devedor justifique a execução da dívida, isso não confere ao credor o direito de alienar o bem por qualquer preço, independentemente de sua avaliação justa.

A execução extrajudicial, embora mais rápida, deve seguir as mesmas normas de proteção ao devedor que a execução judicial, com especial ênfase na vedação ao preço vil. 

Tal prática, além de configurar um risco de enriquecimento ilícito para o arrematante, representa uma grave violação da legalidade e da justiça no processo de execução.

Por isso, não se pode arrematar imóvel por preço vil, mesmo em uma execução extrajudicial, porque essa conduta contraria princípios fundamentais do direito, comprometendo a integridade do sistema jurídico na totalidade. 

O respeito ao valor real do imóvel e a manutenção do equilíbrio nas relações entre credor e devedor são aspectos indispensáveis para garantir a segurança jurídica e evitar abusos no processo de execução.

Arrematação de imóvel e a função social da propriedade

A função social da propriedade é um princípio fundamental do direito constitucional brasileiro, que busca garantir que a posse e a utilização da propriedade atendam a interesses coletivos e não apenas individuais. 

No contexto da execução extrajudicial, esse princípio se aplica diretamente à arrematação de imóveis, especialmente quando o bem é colocado à venda em um leilão para o pagamento de dívidas. 

A função social da propriedade implica que o bem deve ser utilizado de forma a contribuir positivamente para a sociedade, respeitando os direitos do proprietário, bem como as necessidades sociais e econômicas.

Arrematar um imóvel por preço vil — isto é, por um valor muito abaixo de seu valor de mercado — contraria esse princípio por transformar o processo de execução em um mecanismo de especulação, que pode beneficiar injustamente o arrematante em detrimento do devedor e da própria finalidade do processo. 

Isso pode gerar uma violação da dignidade da pessoa humana, ao permitir que o devedor perca sua propriedade por um preço irrisório, prejudicando o próprio valor social do bem. 

Além disso, uma venda de imóvel por preço vil pode estimular práticas que visam à apropriação indevida de bens, comprometendo a função social da propriedade ao desconsiderar a proteção do patrimônio do devedor e os valores de mercado.

Transparência e boa-fé nos leilões extrajudiciais

A transparência e a boa-fé são princípios que devem nortear todos os aspectos do processo de leilão extrajudicial, desde a publicação do edital até a efetivação da arrematação. 

O intuito é garantir que o processo seja conduzido de maneira legítima, com a máxima clareza sobre as condições do bem e as regras do leilão. 

A publicidade adequada do edital, com a ampla divulgação das informações pertinentes, é fundamental para que todos os interessados possam avaliar o bem de maneira justa e tomar decisões informadas.

Uma das medidas fundamentais para assegurar essa transparência é a divulgação do valor de avaliação do imóvel, o que permite que o arrematante tenha uma noção precisa do valor de mercado do bem e possa participar do leilão de maneira justa

Além disso, a abertura para lances deve ser conduzida de forma que todos os participantes tenham igualdade de condições para fazer suas ofertas, evitando que o processo seja distorcido por lances abaixo do valor justo ou por outras práticas prejudiciais à integridade do processo.

Conclusão

Como se pode perceber, a vedação à arrematação por preço vil é uma salvaguarda fundamental nas execuções extrajudiciais. 

Não se pode arrematar imóvel por preço vil porque isso compromete os valores essenciais do ordenamento jurídico, como a dignidade da pessoa humana, a proporcionalidade e a função social da propriedade. 

Portanto, tanto a legislação quanto a jurisprudência caminham no sentido de assegurar que a arrematação de imóvel ocorra por preço justo e dentro dos parâmetros legais.

A execução extrajudicial, apesar de ser um meio eficiente para cobrança de dívidas, não pode se tornar um mecanismo de injustiça ou de violação de direitos. Por isso, a atuação do STJ, aliada à recente alteração legislativa, tem sido decisiva para garantir que arrematar imóvel por preço vil não seja permitido nem tolerado.

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